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Estado de Minas PETER LUND - 220 ANOS

Expedi��o refaz passos de Peter Lund e desvenda dias de hero�smo e bravura

Al�m de localizar caverna que pode ser aquela descrita pelo pai da paleontologia, seus atributos pouco conhecidos s�o redescobertos por grupo que EM acompanhou


17/06/2021 06:00 - atualizado 17/06/2021 07:45

Equipe localizou em rochas de difícil acesso a possível caverna pioneira de Lund, procurada há 10 anos(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Equipe localizou em rochas de dif�cil acesso a poss�vel caverna pioneira de Lund, procurada h� 10 anos (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

 

Dependurar-se em pared�es �ngremes. Rastejar por c�maras subterr�neas e galerias alagadi�as. Apalpar rochas no escuro, a cent�metros das aranhas mais venenosas do Brasil. Deslizar por encostas que abrem a carne e partem os ossos. Seguir os passos do naturalista dinamarqu�s Peter Wilhelm Lund em suas aventuras, entre 1835 e 1844, na regi�o c�rstica de Lagoa Santa, foi uma aventura que demandou pesquisas, esfor�os f�sicos, planejamento e sacrif�cios. Mas os resultados da expedi��o seguida pelo Estado de Minas, entre 3 e 5 de junho, reafirmam a import�ncia do cientista, considerado o pai da paleontologia brasileira, naquele que seria seu anivers�rio de 220 anos, comemorados na �ltima segunda-feira e que o EM mostra em s�rie que termina nesta edi��o.

 

Essa aventura e a reconstitui��o dos passos hist�ricos de Peter Lund e de seu insepar�vel companheiro, o artista noruegu�s Peter Brandt, demandou percurso de 660 quil�metros entre Belo Horizonte, Lagoa Santa, Pedro Leopoldo, Matozinhos e Curvelo, incluindo dois parques estaduais, o da Cerca Grande e o do Sumidouro, propriedades rurais, a cadeia de montanhas da Serra de Santa Helena e o cerrado da Bacia Hidrogr�fica do Rio das Velhas.

 

Momento alto da viagem foi presenciar quando pesquisadores constataram que uma caverna long�nqua perdida em uma encosta �ngreme de Curvelo era a primeira gruta descrita por Lund e Brandt, a Lapa dos Gentios, que estava desaparecida h� 186 anos. � descoberta se seguiram as dificuldades das explora��es da dupla e ainda um importante alerta sobre o sumi�o da c�psula do tempo em homenagem ao cientista, lan�ada em 1934, em BH, e que tem o seu paradeiro ignorado.

 

A pe�a fundamental para essa expedi��o, em parceria com especialistas do Centro Universit�rio Newton Paiva e do Grupo de Estudos Espeleol�gicos Opili�o, foi o pesquisador e professor da institui��o Luciano Emerich Faria, que � doutor em hist�ria da ci�ncia. Obstinado explorador das cavernas mineiras, Faria procurava h� 10 anos pela Lapa dos Gentios, considerada a primeira caverna descrita por Peter Lund e seu insepar�vel parceiro de aventuras, Peter Brandt, em 1835, quando teve in�cio a �ltima fase de explora��es. A procura da caverna foi tema da primeira reportagem da s�rie, mas j� em 2016 o professor levou a reportagem a uma outra gruta de Peter Lund que foi reencontrada, a Lapa da Forquilha, em Baldim.

 

Para localizar a lapa, o professor procurou em comunidades rurais de Curvelo not�cias sobre grutas pr�ximas, mas as pessoas, inclusive os mais antigos moradores da regi�o, nem sequer conheciam cavidades rochosas perto de suas casas. At� que, com a ajuda do vice-prefeito da cidade, Gustavo Nascimento, o pesquisador soube de uma caverna erma, onde poucos iam, no alto de um pared�o rochoso de quase 100 metros que se torna cachoeira quando chove.

 

“Eu mesmo, que sou da regi�o, nascido no distrito de S�o Jos� da Lagoa (JK), n�o sabia dessa gruta. Mas chamou a aten��o pelo c�rrego e o nome da comunidade ser 'dos Gentios', como a lapa de Lund. O que nos moveu a apoiar essa expedi��o � descobrir e promover estudos desse que pode ser um tesouro para a hist�ria da nossa cidade”, afirma Gustavo Nascimento.

 

Lacuna preenchida Outras cavernas candidatas a Lapa dos Gentios tamb�m foram visitadas na expedi��o, algumas ainda mais long�nquas, sem estradas de acesso ou trilhas demarcadas, mas acabaram descartadas pelos c�lculos comparativos. Pelos caminhos at� a Lapa dos Gentios, com fac�es, �gua, instrumentos de medi��o, filmagem e fotografia, os oito integrantes da expedi��o enfrentaram escalada em pared�es �ngremes. O impacto de ver as formas desenhadas por Brandt se encaixando na estrutura de rochas que o grupo vasculhava � dos momentos mais significativos de qualquer descoberta ou redescoberta cient�fica. Uma lacuna na hist�ria que se preenche.

 

Seguir os passos de Lund e Brandt, imaginando-os dependurados no alto de encostas como a da Lapa dos Gentios, muda a percep��o das condi��es de trabalho enfrentadas pela dupla de desbravadores e revela um lado de extrema coragem que � pouco conhecido. Os longos deslocamentos da expedi��o pelo cerrado mineiro, entre Curvelo, Matozinhos, Pedro Leopoldo e Lagoa Santa, d�o uma ideia do esfor�o da dupla, que percorria essas dist�ncias em lombos de burros, no in�cio do s�culo 19.

 

Com apoio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Semad), que possibilitou acesso aos s�tios explorados por Lund em parques estaduais, acolhendo tamb�m a reportagem em suas depend�ncias, as paisagens naturais e rochas preenchidas por pinturas rupestres de mais de 10 mil anos ficaram mais acess�veis, mostrando que se conservam praticamente do mesmo jeito em que estavam quando foram ilustradas pelo noruegu�s Peter Brandt. O grupo percorreu as incr�veis forma��es de Cerca Grande, pronta para se tornar um parque totalmente do estado, em setembro, e a Lapa do Sumidouro, onde Lund fez as descobertas que mudaram o entendimento da hist�ria.

 

O ingresso na Lapa do Sumidouro mostrou como foi dif�cil para Lund chegar at� os f�sseis de 30 indiv�duos e verificar que o pr�-hist�rico homem de Lagoa Santa conviveu com as feras extintas da Idade do Gelo. Logo na entrada apertada, observa-se um canal que Lund construiu para desviar a �gua que entra por fendas na superf�cie, os sumidouros, e cursos dentro da caverna, alagando partes da cavidade por longos meses.

 

Tal umidade torna a caverna escorregadia e por isso perigosa, a ponto de dificultar a sua explora��o, propiciando muitos tombos e quedas, tendo o rep�rter Mateus Parreiras deslizado de uma descida com dois metros de altura e quebrado a s�tima costela do lado direito. Ainda assim, a explora��o continuou. Para penetrar na caverna, s� rastejando, e � perto do ch�o que se observa uma cobertura diferente formada por conchas de crust�ceos recobrindo o solo, mostrando que o ambiente realmente fica alagado em algumas �pocas. Outro habitante frequente e perigoso s�o as aranhas marrons, um dos aracn�deos mais venenosos do Brasil, produtor de veneno necrosante que pode levar a mutila��es, fal�ncia renal e at� a morte.

A equipe


Relatos dos integrantes do grupo que conduziu o trabalho de remontar os passos conhecidos e desconhecidos de Peter Lund

(foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
(foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
LUCIANO EMERICH FARIA
Pesquisador e professor do Centro Universit�rio Newton Paiva

 
“Quando comecei na espeleologia, no ano 2000, uma das primeiras refer�ncias cient�ficas que tive nessa ci�ncia foi a de Peter Lund. A hist�ria de sua dedica��o � paleontologia � contagiante, pois ele praticamente dedica sua vida ao desenvolvimento cient�fico, mesmo que isso lhe custasse sua sa�de, sua heran�a ou mesmo suas cren�as. Lund n�o s� nos inspira, como nos provoca a querer conhecer mais. Ao longo desses 20 anos em que trabalho com cavernas, sempre tento me espelhar no exemplo desse importante mestre. Espero resgatar um pouco de sua mem�ria e render a esse ilustre dinamarqu�s as homenagens necess�rias, que possa atribuir a Peter Lund e � ci�ncia que ele representa formas de a humanidade atingir o sonho de ser imortal. Trabalhar com as cavernas, no entanto, envolve trabalho de convencimento, pois muitos propriet�rios se recusam a permitir que se entre em seus terrenos e as explore. Remontar as pe�as e trazer de volta ao conhecimento as cavernas perdidas permite avan�ar no resgate das hist�rias de Lund. Esse pode ter sido um grande valor desta expedi��o.”
 
 

(foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
(foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
LEANDRO  COURI
Rep�rter fotogr�fico do Estado de Minas

 
“Quando demos in�cio � execu��o da nossa pauta sobre os 220 anos do Dr. Lund, a mente do fot�grafo j� pensou em v�rios acess�rios para levar. � o tipo de pauta em que se leva tudo. S�o trip�s, luzes, objetivas grande-angular, normal, tele, macro, filtros; uma parafern�lia. Para reportar com a qualidade m�xima, assim como nos tempos de Peter Wilhelm Lund e Peter Andreas Brandt, levamos equipamento pesado ao desbravar de cada forma��o natural, pois, al�m da dificuldade t�cnica em se iluminar locais com aus�ncia completa de luz, o traslado dessa log�stica tamb�m se torna um desafio a mais. Nada que a equipe, com paci�ncia, cuidado e calma n�o conseguiu resolver. Por�m, num descuido de um acidente com o parceiro, o rep�rter Mateus Parreiras, deu para sentir que n�o se pode vacilar. Foi pensar nisso e j� demos de cara com uma aranha marrom, cuja picada traz s�rios problemas, al�m da dor. Novamente, valeu a m�xima do fot�grafo: mantenha o foco. Entre as li��es de mais uma investida no mundo descoberto pelo doutor Lund ficou o aprofundamento de uma quest�o de grande import�ncia: a natureza deve ser respeitada e a hist�ria sempre aprofundada. O prazer desse aprendizado � de encher o cora��o, mesmo com toda a dificuldade de chegar a cada lugar. Destaque inesquec�vel foi a escalada do pared�o da Lapa dos Gentios. Ao chegar l� e constatar a (nossa) proeza dos pesquisadores quase dois s�culos atr�s, naquela cavidade quase invis�vel para quem n�o conhece a regi�o, sem d�vida foi como um trof�u de um descobrimento, agora jornal�stico, mas que tamb�m contribui ao se juntar ao material hist�rico para pesquisas futuras.”
 

(foto: Alexandre Guzansher/EM/DA Press)
(foto: Alexandre Guzansher/EM/DA Press)
MATEUS PARREIRAS
Rep�rter do Estado de Minas

 
“Poucas vezes um jornalista tem a chance de estar dentro do restrito grupo que v� se materializar � sua frente um fato hist�rico relevante o suficiente para repercutir no futuro. Estar na primeira equipe de espele�logos e cientistas que reencontrou a primeira caverna descrita por Lund e Brandt, a Lapa dos Gentios, depois de 186 anos, foi um testemunho inesquec�vel. Para o jornalismo, o mais pr�ximo poss�vel de uma narra��o, ao contr�rio da rotineira dist�ncia de se ouvirem vers�es de um feito. Foi a segunda vez que, pela parceria com o professor Luciano Faria, a quem conhe�o desde 2004, e o grande parceiro de in�meras explora��es, o rep�rter fotogr�fico Leandro Couri, pude revelar uma caverna desaparecida de Peter Lund. A primeira foi a Lapa da Forquilha, em 2016. E essa expedi��o teve muitos desafios e demandou planejamento rodovi�rio por trilhas, topogr�fico, pesquisa hist�rica e contatos com autoridades e locais. O esfor�o em campo tamb�m foi grande. Ao mesmo tempo em que percorremos longas dist�ncias com os pesquisadores, Leandro e eu precisamos registrar as imagens em imagem, v�deo, fotografia esf�rica, fazer anota��es, estar � frente e atr�s deles. Isso nos exp�e a perigos muito grandes, uma vez que perdemos um ou dois apoios em pared�es rochosos e montanhas para fazer os registros. Em uma dessas incurs�es, j� cansado pelo dia de atividades, mas apertado pelo prazo ex�guo ante tudo que precisava ser feito, logo na primeira noite, quando est�vamos descendo a Lapa do Sumidouro, sofri uma queda de cerca de dois metros dentro da gruta, batendo as costelas nas rochas e quebrando o s�timo osso da direita. Essa dor e os demais esfolados nos bra�os e pernas precisaram ser superados, pois ainda precisar�amos de explorar toda essa caverna, al�m de continuar pela expedi��o nos dias seguintes. Nossa miss�o, agora, � fazer com que os feitos e homenagens de Peter Lund se mantenham vivos, seja explorando suas cavernas, pared�es rupestres e trilhas ou exigindo que o poder p�blico localize a sua c�psula do tempo, enterrada em 1934, em Belo Horizonte, e que est� desaparecida.”
 

Pela ci�ncia


A s�rie de reportagens do rep�rter Mateus Parreiras e do rep�rter fotogr�fico Leandro Couri, que o Estado de Minas exibiu de domingo � edi��o de ontem, retratou o resultado da expedi��o que percorreu caminho desbravado no s�culo 19 pelo pai da paleontologia, Peter Lund, na regi�o de Lagoa Santa e entorno. A reportagem fez importante relato sobre a poss�vel redescoberta da Lapa dos Gentios, contou detalhes sobre o trabalho do naturalista dinamarqu�s e alerta para o sumi�o da c�psula do tempo, homenagem feita no centen�rio de suas expedi��es em Minas. 


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