BH: Justiça barra ‘ameaça’ de desocupação forçada no antigo prédio do Dops
Espaço, na Avenida Afonso Pena, foi utilizado para tortura na ditadura militar. Manifestantes estão no local para pressionar implantação de memorial
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Siga noA Justiça concedeu salvo conduto a fim de proibir que — em um primeiro momento — a Polícia Militar faça uso da força para retirar os ocupantes do antigo prédio do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), localizado na Avenida Afonso Pena, Região Centro-Sul de Belo Horizonte. A decisão decorre do julgamento de habeas corpus impetrado pela Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG.
O imóvel foi tombado em 2015 pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha). Como mostrou o Estado de Minas, grupos sociais completaram um mês de ocupação do local na quinta-feira (1/5) com o objetivo de pressionar o governo de Minas a implementar no espaço o intitulado Memorial dos Direitos Humanos Casa da Liberdade. Na ditadura militar, o local foi utilizado para torturar opositores.
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Para o juiz Leonardo Antônio Bolina Filgueira, da Central de Inquéritos Policiais da Comarca de Belo Horizonte, embora não tenha sido relatado nenhum ato concreto de violência ou de restrição ao direito à manifestação, “a presença da polícia no prédio configura constrangimento ilegal, dado ao legítimo poder de força que possui”. Logo, o magistrado entendeu que “há elementos mínimos que indiquem a existência de ameaça concreta ou coação ilegal capaz de justificar o salvo conduto”.
“Ainda que necessária a presença dos militares para fiscalização e acompanhamento da ocupação, deve-se garantir aos manifestantes o direito ao diálogo e à negociação com o Poder Público, antes do emprego de força policial para fins de desocupação forçada”, avaliou o juiz, determinando que “a Polícia Militar só faça uso da força após provar, formalmente, que iniciou negociação com os manifestantes”.
Durante a ocupação, os movimentos têm promovido diversas atividades abertas ao público, como cineclubes, debates políticos, shows, exposições de arte e visitas guiadas.
O projeto do memorial havia sido lançado em abril de 2018, com previsão de inauguração no fim daquele mesmo ano, no governo de Fernando Pimentel (PT). A escolha da antiga sede do Dops para abrigar o equipamento cultural visava conscientizar os visitantes sobre os crimes cometidos no passado. O local foi usado durante o regime militar para práticas de repressão e tortura a perseguidos pela ditadura. Porém, a burocracia e atrasos recorrentes nas obras empacaram o projeto.
De acordo com o Iepha, o memorial contará com áreas museográficas, centro de pesquisa sobre a história política brasileira, acervo documental das agências de repressão e espaços para reuniões, eventos culturais, debates e apresentações artísticas.
A Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese) informou na segunda-feira (5/5) que está finalizando as etapas administrativas, assim como a elaboração e conclusão do projeto museológico. O órgão destacou que reformas emergenciais já foram concluídas para garantir a conservação do local. Melhorias estruturais e instalações elétricas e hidrossanitárias do prédio são alguns exemplos.
Comissão de reabertura do memorial
A partir da ocupação, foi criada uma comissão de reabertura do memorial, composta por integrantes de movimentos sociais. Segundo Mariana Fernandes, presidente da Unidade Popular pelo Socialismo (UP) em Belo Horizonte, a comissão, formada por seis pessoas, realizou uma audiência com professores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Durante o encontro, os professores apresentaram o documento que embasou o projeto original de 2018. O grupo agora analisa o material, buscando possíveis melhorias. “Alguns espaços podem ser mais bem aproveitados do que o que está previsto no projeto anterior, especialmente em relação à preservação dos ambientes e dos equipamentos usados para tortura durante a ditadura”, explicou Mariana.
Ela também relatou uma dificuldade de acesso a documentos históricos: “Professores de história da UFMG fizeram uma pesquisa com gravações de ex-presos políticos relatando suas experiências aqui no prédio, mas até hoje não conseguimos acessar esses arquivos”, denunciou.